Temos argumentado neste espaço sobre o conceito da Trindade Essencial, que diz que para que um segmento de alta tecnologia tenha sucesso, não basta apenas ter um “ecossistema” de empresas e organizações associadas; o essencial é que esse ecossistema esteja voltado a produzir “plataformas” (de preferência globais) de geração de produtos, processos e serviços, e que estas definam sólidas “arquiteturas de negócios”.
Para dar suporte a este argumento, basta uma leitura ao livro que ora resenhamos, intitulado “Platforms, Markets and Innovation” (Plataformas, Mercados e Inovação), editado por Annabelle Gawer, em 2008, pela editora Edward Elgar (não temos conhecimento se há tradução para o português). Trata-se de uma coletânea internacional de artigos voltada para a discussão do conceito de plataformas.
O livro foi concebido pela Annabelle Gawer (hoje Professora de Estratégia e Inovação do Imperial College Business School, em Londres/Inglaterra) por uma simples razão. Desde que completou seu doutorado sobre plataformas líderes, e publicou seu primeiro livro (Gawer, AandM.A. Cusumano, 2002: Platform Leadership: How Intel, Microsoft, and Cisco Drive Industry Innovation, Boston, MA: Harvard Business School Press), ela percebeu que muitos pesquisadores individuais fizeram importantes progressos, cada um em seu campo, que puderam contribuir para um maior entendimento do fenômeno multifacetado das plataformas.
O livro compreende 14 (quatorze) capítulos, e está dividido em três partes. A Parte I apresenta uma visão geral das plataformas. A parte II foca em questões específicas relacionadas com a abertura e o fechamento de plataformas, bem como em questões de governança de plataformas. A parte II foca em questões de gestão, projeto e conhecimento de plataformas.
Seu objetivo é oferecer um relato verdadeiramente multidisciplinar do fenômeno multifacetado das plataformas, e foi pensado com a intenção de se tornar uma referência para estudantes e pesquisadores, bem como em ser acessível aos gestores que cuidam de questões de inovação, competição, desempenho de empresas, projeto e desenvolvimento tecnológico.
Como bem destacado logo no início do livro pela Profa. Gawer, nós encontramos plataformas em várias indústrias, e certamente em todas as indústrias de alta tecnologia. Google, sites de redes sociais tais como Facebook, sistemas operacionais em telefonia celular, consoles de videogames, mas também em cartões de pagamentos, e algumas tecnologias genômicas são todas plataformas industriais. Mas talvez a plataforma mais coberta pela mídia (e um exemplo arquétipo) é o Windows da Microsoft.
Estendendo seu exemplo, ela afirma que o Windows é uma plataforma industrial – um bloco em construção, provendo uma função essencial para um sistema tecnológico – que age como uma fundação sobre a qual outras empresas podem desenvolver produtos complementares, tecnologias e serviços. Como uma plataforma, ela é sujeita aos chamados “efeitos de rede”, os quais tendem a reforçar de uma maneira cumulativa vantagens prematuramente ganhas, tais como uma base instalada de usuários, ou a existência de produtos complementares. Em um loop de “feedback positivo”, novos usuários se beneficiam mais em usar Windows do que em usar uma plataforma alternativa, à medida que já está instalada em muitos PCs e, portanto, facilita a troca de arquivos e a interoperabilidade em geral.
Mas o que verdadeiramente sobressai do livro (além da constatação importante de que com o conceito de plataforma a teoria existente está mostrando seus limites) são as suas principais perguntas, e, consequentemente, as respostas que os artigos contêm. Segundo a Profa. Gawer, o emergente fenômeno das plataformas afeta a dinâmica industrial, cria novas formas de competição, revela novas formas de colaboração entre as empresas, e coloca um conjunto de novas questões fundamentais.
Sendo assim, no contexto das plataformas, pergunta: “como nós avaliamos os trade offs entre inovação na plataforma, desenvolvida pelos proprietários da plataforma, e inovação em complementos ou módulos, desenvolvida pelos complementadores? Que categorias de governança de plataformas se deve colocar para assegurar o melhor funcionamento das plataformas e ecossistemas?”
Logo, temos as questões de dinâmica industrial: “sob que condições podemos esperar que uma plataforma industrial (e aqui colocamos a indagação desta newsletter não somente para a indústria) emerja? E, então, há também as questões estratégicas: como podem as empresas ter sucesso no novo jogo das plataformas? Que capacidades são necessárias? Quando as empresas devem abrir suas tecnologias e processos, ou quando elas devem adotar estratégias proprietárias? Como sabemos que estratégia é a melhor, dadas as circunstâncias da indústria ou da empresa?”
Finalmente, há as questões relacionadas com a gestão e o projeto de plataformas, bem como as implicações para a competição internacional e para a divisão do trabalho. Por exemplo: “como gerenciar os processos exploratórios de criar uma plataforma? Como gerenciar projetos de desenvolvimento de plataformas? Como gerenciar a criação de conhecimento associado com as práticas coletivas de inovação? E, por último, mas não de menor importância, quais são as implicações disto tudo para a competição e inovação em serviços?”
Eis aí um livro que veio em boa hora, e veio para ficar. Trata-se (o próprio livro) de uma “plataforma de conhecimentos” super relevantes para o momento de desafios que estamos atravessando no Brasil, onde conseguimos desenvolver vários ecossistemas de empresas e organizações de alta tecnologia, mas ainda não fomos capazes de produzir uma única plataforma de produtos, processos e serviços relevante no cenário internacional. Quem sabe ele pode contribuir para que possamos edificar uma verdadeira Trindade Essencial!
Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre plataformas, fique a vontade para nos contatar!